Richard
Dawkins é um dos intelectuais da atualidade que eu mais admiro,
aqueles que esperam alguma forma de ataque ou depreciação ao
ilustre cientista, podem desistir agora ou seguirem em frente por
suas próprias contas e riscos. Não li nenhum de seus livros,
conheço o pensamento de Dawkins através de vídeos de entrevistas e
debates. Este ensaio vai abordar apenas uma questão originada pelo
título do livro mais famoso de Dawkins, “Deus, Um Delírio”.
Richard
Dawkins se declara um ateu espiritualista, sua obra “O Conto do
Ancestral”, expressa a espiritualidade existente na evolução e
inspirou um álbum da banda irlandesa Nightwish, que convidou o
cientista para participar na gravação do álbum (aqui). Dawkins
nunca deixou de se declarar espiritualista, mas certa vez, Dawkins se
apresentou como agnóstico, não-crente ou não-teísta.
Em
debate com o arcebispo de Sidney, Austrália, Cardeal George Pell,
Dawkins foi questionado sobre a mudança de posicionamento, de ateu
para agnóstico, sendo respondida a questão da seguinte forma:
“[...] esta é uma questão em andamento, qual é a melhor maneira.
Existe um problema com a palavra ateu, especialmente nos EUA, eu não
sei se isso acontece na Austrália também. […]. Agora o ponto, é
que a palavra ateu é diferente de simplesmente não acreditar em
deus, tem mais conotações, então, uma extensão de pessoas
desejaram partir disso e mudar o nome para não-teísta, secularista
ou não-crente. Eu hesito e volto atrás sobre qual é o melhor nome
a usar”.
Estabelecida
uma referência mínima, do pensamento de Dawkins, é possível
estabelecer a relação entre o título do livro, “Deus, Um
Delírio”, e o título deste ensaio, “Richard Dawkins, Um
Delírio”. Considerando que Dawkins tratou a posição de acreditar
em deus como um delírio, e o título deste ensaio considerou que
acreditar em Dawkins também é um delírio, torna-se necessário
identificar as possíveis diferenças e analisá-las.
A
principal diferença: é possível provar que Dawkins existe, mas não
é possível provar que Deus existe. Em princípio, não há motivos
para considerar que, acreditar em alguém que comprovadamente existe
seja um delírio, mas Dawkins nunca considerou que, acreditar na
existência de vida fora da Terra, seja um delírio, no entanto nunca
foi provado que existe vida fora da Terra. Então a questão do
delírio não reside no fato de estar ou não comprovada a existência
de algo ou de alguém.
No
debate com o Cardeal, Dawkins explicou porque é severamente
contrário ao “darwinismo social”, sendo que ele é um dos mais
eminentes defensores da teoria de Darwin. Agora temos como
referência, alguém que comprovadamente existiu, Darwin, e uma
teoria sustentada por milhões de evidências, “a origem das
espécies”, sendo considerados inapropriados como referência para
o convívio social, pelo próprio Dawkins, que é um dos mais
destacados discípulos de Darwin e um dos maiores propagadores do
darwinismo. Isso sim poderia ser considerado um delírio, mas não é.
Quando
Dawkins deu ao seu livro o título “Deus, Um Delírio”, ele
cometeu um erro, que embora não desqualifique a obra, compromete o
entendimento e restringe a verdadeira amplitude das argumentações,
em verdade, o título do livro gera uma contra argumentação que
utiliza Darwin como exemplo. O título do livro deveria fazer
referência às crenças em torno de deus, como por exemplo,
“Delírios em torno de deus”, incluindo no conteúdo as crenças
delirantes que surgiram em torno de Darwin, mostrando assim os perigo
que pode haver em torno de qualquer crença.
Mas
sem dúvida, por mais equivocado que possa ser, o título do livro
causou o impacto necessário para iniciar um debate que existia
apenas de forma velada para a maioria da população. A questão mais
importante é saber se o debate ficará restrito à existência ou
não existência de deus, ou será ampliado para abordar os delírios
existentes em torno de outras crenças, como o darwinismo, o marxismo
e o próprio ateísmo, que começou a criar para a palavra ateu,
conotações mais amplas do que simplesmente não acreditar na
existência de deus.
Em
resumo, o delírio não está em acreditar na existência de um deus,
vários deuses, fadas ou duendes, mas em criar em torno disso, uma
crença que se propõe a pautar a própria vida e a vida dos outros.
Não há problema em acreditar que o Sol em seu signo astrológico
causa esse ou aquele efeito, o problema está em sentir necessidade
de agir, em cada período da astrologia, da forma como a astrologia
diz que os efeitos acontecerão. O mesmo ocorre com o darwinismo, não
é necessário matar os doentes por causa da seleção natural, ou
adotar algum tipo de comportamento para mostrar aos outros que é
ateu.
Minha
sugestão para a ampliação do debate, corrigindo os erros iniciais,
é o próprio Richard Dawkins publicar um livro abordando as crenças
criadas em torno de outros temas e causar um novo impacto necessário,
desta vez com o título “Ateísmo, Um Delírio”.
PS.
O debate de Dawkins com o Cardeal está aqui.
(Milton
Valdameri, outubro de 2016).
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