Um blog que tem a pretensão de
apresentar ensaios e artigos com mérito filosófico, tem o dever de
apresentar um ensaio apresentando aos seus leitores uma referência
mínima sobre o que é filosofia, mas principalmente, esclarecer aos
leitores de que forma o autor se relaciona com a filosofia, como o
autor entende a filosofia e qual o sentido apropriado para o leitor
entender o termo filosofia, quando for usado pelo autor. Este é o
objetivo deste ensaio e a melhor maneira de começar, é deixando
devidamente explícito que o autor não reivindica o título de
filósofo, nem se sentiria à vontade com esse título.
A origem etimológica da palavra filosofia vem do grego e literalmente significaria “amor ao conhecimento”, mas considerando que amor é algo que você sente e não algo que você pratica, a filosofia só se torna praticável quando seu significado é apresentado como “busca do conhecimento”. É muito oportuno mencionar que, há muitos anos, li um artigo sobre filosofia, onde alguns “filósofos” mencionados diziam que não existe filosofia oriental, existe apenas sabedoria oriental, o termo filosofia só poderia ser aplicado àquilo que foi produzido com base nos filósofos da Grécia antiga.
Diante deste blog, filosofia é
buscar conhecimento, não importa se o indivíduo é ocidental,
oriental ou pré-histórico. Mas existe um ponto determinante, que é
o significado literal da palavra, “amor ao conhecimento”, este
ponto diferencia a busca pelo conhecimento por necessidade ou
interesse pessoal, da busca pelo conhecimento por amor, para ampliar
o conhecimento mesmo que não receba nenhuma recompensa por essa
busca. Isso não deve ser entendido como buscar informações
inúteis, inclusive porque informação e conhecimento, são coisas
distintas que serão abordadas depois, significa que a utilidade de
uma informação também está sujeita à busca do conhecimento.
Poucas pessoas sabem, mas até o
Iluminismo, ciência e filosofia eram a mesma coisa, porém, aquilo
que hoje denominamos como ciência, era denominada como filosofia da
natureza. Ou seja, a filosofia se dividia em buscar o conhecimento do
comportamento do ser humano e o comportamento da natureza.
Atualmente, o comportamento da natureza é estudado pela ciência,
que possui várias ramificações, denominadas de ciências exatas,
enquanto que a filosofia se tornou uma ramificação daquilo que foi
denominado como ciências humanas.
Lamentavelmente, essa divisão
transformou o estudo do comportamento humano em mera especulação,
os princípios do conhecimento, identificados pelos filósofos
gregos, simplesmente foram abandonados. O próprio curso de filosofia
é apenas o estudo da história da filosofia e dos filósofos, a
produção de conhecimento foi substituída por produção de
opiniões. As exceções, que felizmente existem, corrigem esse
problema através da filosofia da ciência, que é uma disciplina
dedicada a preservar e ampliar a essência do conhecimento, essa é a
disciplina responsável pelo método científico.
Então vamos ver a diferença
entre conhecimento e informação. O conhecimento pode ser dividido
em três qualidades, científico, filosófico e comum. A informação
pode ser dividida em duas qualidades, verdadeira ou falsa.
Conhecimento, é quando é possível demonstrar que uma informação
é verdadeira ou falsa, sem isso, a informação é crença, não é
conhecimento. O conhecimento comum é adquirido no cotidiano e não
requer nenhum método, o indivíduo se queima uma vez e adquire o
conhecimento de que agindo daquela maneira vai se queimar, é
basicamente isso.
O conhecimento científico deve
atender aos critérios do método cientifico, obviamente, mas nem
sempre esse conhecimento é exato, ou melhor dizendo, nem sempre é
absoluto, pois muitas vezes, nem todas as informações necessárias
estão disponíveis. Apenas para citar um exemplo, até hoje a
ciência não sabe dizer o que é a gravidade, mesmo podendo
calculá-la. Mas este ensaio não pretende se aprofundar em método
científico, pois ele é baseado nos fundamentos da filosofia.
Infelizmente, nunca houve um
tratado filosófico para estabelecer um método filosófico e o
método científico é ignorado solenemente sob a desculpa
esfarrapada de que filosofia não é ciência exata. Então vou
apresentar aqui, aquilo que entendo que deveria ser adotado
minimamente como método, pela filosofia e todas as disciplinas que
se enquadram em ciências humanas. Os princípios são os mesmos do
método científico: verificação ou exame do objeto de estudo
(ceticismo), argumentação com consistência lógica (lógica),
comparação com a argumentação contrária (dialética), e
apresentação das circunstâncias capazes de mostrar que a
argumentação está errada (falseabilidade). Atendendo a esses
critérios, um conhecimento pode ser considerado filosófico, sem
isso, é opinião ou crença, jamais conhecimento.
O ceticismo surgiu com Pirro de
Élis, mas a escola do ceticismo não prosperou, pois criou uma
armadilha para si mesma, começou alegar que não bastava provar, era
necessário provar que a prova provava, e assim sucessivamente. A
lógica foi apresentada ao mundo, de maneira formal, por Aristóteles,
contemporâneo de Pirro. A lógica é a base de todo o conhecimento,
mas ela própria está sujeita ao ceticismo, é necessário verificar
se as premissas são verdadeiras e se o raciocínio em si é
consistente.
A dialética era usada por
Sócrates, não existe nenhuma dialética de Marx ou de Hegel, como
acreditam os marxistas. Dialética consiste em apresentar uma tese
diante de uma tese contrária (antítese), como forma de por a tese
sob avaliação, podendo resultar da dialética, tanto a supremacia
de uma das teses, como uma tese totalmente nova (síntese). Essa
descrição do que é dialética, está de acordo com a descrição
usada por Hegel, mas isso não significa que ele tenha inventado uma
dialética diferente daquela usada por Sócrates, apenas descreveu o
que é dialética de uma maneira mais apropriada.
A falseabilidade surgiu apenas
na década de 1930, com Karl Popper, é princípio essencial para o
conhecimento, pois não há conhecimento baseado no não saber, ou
seja, ninguém pode dizer que algo está correto, sem saber o que
faria aquilo estar errado. O exemplo típico é: dizer que todos os
cisnes são brancos, vai se mostrar falso se alguém encontrar um
cisne preto. Esse critério resolve o problema do ceticismo, quanto à
necessidade de provar que a prova é realmente uma prova, pois
oferece aos outros a possibilidade de refutar aquilo que foi
afirmado.
É importante observar que
nenhum critério funciona isoladamente,, portanto, por mais
verdadeira que seja uma informação, ela só será conhecimento
filosófico se atender aos quatro critérios, caso contrário a
informação será superficial e vazia, será igual à uma opinião
ou crença. Mas existe uma maneira mais simples de entender os
princípios do conhecimento filosófico: a) descrever detalhadamente
o objeto do estudo; b) descrever detalhadamente o método do estudo e
as premissas envolvidas; c) apresentar o estudo para ser verificado
por outras pessoas; d) identificar aquilo que pode demonstrar que o
estudo está incorreto.
O motivo pelo qual a filosofia
abandonou os critérios do conhecimento é facilmente identificável,
durante mais de mil anos, a religião dominou o ensino na cultura
ocidental, quando a ciência se separou da filosofia, também se
separou da religião, enquanto que a filosofia e suas ramificações
continuaram sob influência da religião, onde a autoridade do
indivíduo dispensava o uso dos critérios de avaliação do
conhecimento. Seria razoável se aqueles que reivindicam o status de
ciências humanas para suas atividades, refletissem sobre estarem
produzindo conhecimento ou crença, se é ciência ou religião.
Milton Valdameri (janeiro de
2017).
Nenhum comentário:
Postar um comentário