sábado, 8 de abril de 2017

Por Trás das Armas Químicas

Em 04/04/2017 (terça-feira), foram usadas armas químicas no conflito da Síria, em 07/04/2017 (sexta-feira), os EUA bombardearam uma base aérea na Siria, por ordem do presidente Donald Trump. A repercussão desses eventos foi insignificante, diante do significado que eles podem ter, mas principalmente diante do evento que teve a maior repercussão nos noticiários do mundo inteiro, o sinal de ruptura entre Donald Trump e o governo russo de Vladimir Pútin.

O governo da Rússia se manifestou dizendo que a arma química foi usada pelos rebeldes opositores do governo sírio, condenando o bombardeio e dizendo que Trump deveria ter esperado pelas respostas das investigações internacionais. Isso simplesmente reforçou o sinal de ruptura. É evidente que Trump deveria esperar uma investigação internacional antes de tomar qualquer decisão, mas isso não teria o significado de ruptura com o governo da Rússia.

Mas por que o sinal de ruptura é tão importante para o Trump? Muito simples, ele está sendo investigado por sua relação com o governo da Rússia e corre o risco de ser acusado de traição. O bombardeio não encerra a investigação, mas tira a investigação do centro dos noticiários e substitui pela tal ruptura. Ou seja, mesmo que seja comprovado o apoio da Rússia na eleição do Trump, ele terá mostrado que não exitará em se colocar contra a Rússia, desmontando a tese de traição.

Mas considerando a hipótese de que Trump é um traidor aliado ao presidente Putin, da Rússia, o que a aliança Putin-Trump teria a ganhar com esse episódio trágico pastelão? A resposta desta pergunta pode estar por trás do uso da arma química, por isso é necessário observar, com cautela, algumas informações que mostram um cenário futuro preocupante, para não dizer aterrorizante.

O ex-presidente dos EUA, Barack Obama, tinha estabelecido ao governo da Síria, um limite que foi denominado de “linha vermelha” (red line), onde o uso de armas químicas seriam respondidos com ataques militares. Uma semana antes do bombardeio, o governo Trump divulgou informações de que o governo da Síria não representava uma prioridade, que a prioridade na Siria era combater o Estado Islâmico.

De certa forma, Trump revogou o limite estabelecido por Obama e uma semana depois fez aquilo que o limite do Obama estabelecia, mais que isso, Trump deixou de ter como prioridade o Estado Islâmico e passou a ter como prioridade o fim do governo de Bashar al-Assad na Síria. Mas a revogação do Trump não explica o uso de arma química pelo governo da Síria, os rebeldes estão sob controle e o conflito está praticamente decidido em favor do governo sírio, não há motivos para usar arma química e colocar a comunidade internacional contra a Síria. Inclusive é nisso que a Rússia se baseia para dizer que foram os rebeldes que usaram a arma química.

O resultado disso tudo é uma grande névoa, onde os personagens se tornam vultos igualmente suspeitos e igualmente sujeitos a cometer erros. Na mesma declaração do governo russo, condenando o bombardeio, foi declarado que a Rússia teria agido da mesma forma, se estivesse no lugar dos EUA, ou seja, reconheceu o direito de cometer erros. Trocando em miúdos, o que isso significa?

Uma investigação internacional vai determinar se o governo da Síria é culpado ou inocente, ou seja, a névoa será dissipada. Se o governo da Síria for inocente, o Trump já era, envergonharia os EUA, sofreria uma derrota para o Pútin, e passaria de aliado do Pútin a capacho do Pútin. Mas se o governo da Síria sair como culpado, Pútin não será visto como derrotado, será visto como traído pelo governo da Síria. É necessário lembrar que a Rússia possui bases militares instaladas na Síria, com a permissão e por pedido do governo sírio.

Basta estabelecer a culpa do governo da Síria, para que Pútin e Trump se unam para implantar um novo governo na Síria e combaterem juntos o Estado Islâmico. Trump sai vitorioso sem que Pútin saia derrotado, os dois se tornam aliados oficialmente, perante a comunidade internacional, a ONU vira uma barraca de informações turísticas e o mundo terá o tão sonhado fim da guerra fria. Nenhum país será aliado dos EUA sem ser aliado da Rússia e vice-versa.

O que há de aterrorizante nisso tudo? Uma questão que não será mostrada ao público: qual a possibilidade do governo da Síria usar arma química sem a anuência da Rússia, e qual a possibilidade da Rússia usar arma química sem a anuência do governo Sírio? Seja como for, é apenas uma questão de tempo para saber se o rompimento do noivado resultará na consumação do casamento. Mas se a investigação determinar que houve envolvimento da Rússia no uso da arma química, aí tudo pode acontecer, inclusive nada.

(Milton Valdameri, abril de 2017).


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