A Operação Lava Jato está
sendo a menina dos olhos da maioria da população brasileira há
três anos. Os últimos acontecimentos, ocorridos entre 17/05/2017 e
23/05/2017, colocaram a Lava Jato em situação, no mínimo,
preocupante. Em primeiro lugar é necessário dizer que a Lava Jato
nunca foi uma primazia jurídica, mas também é necessário dizer
que, no Brasil, o mundo jurídico é caótico, portanto não se pode
esperar primazia jurídica em nenhuma operação. Este ensaio tentará
enxergar além da cortina de fumaça que envolveu a vida política e
jurídica do Brasil.
Em
17/05/2017, por volta das dezenove horas, o jornalista Lauro Jardim
publicou em seu blog, hospedado por O Globo, o vazamento de uma
gravação onde Joesley, do grupo J&F, controlador do JBS
(Friboi), conversou com o presidente da república, Michel Temer.
Nessa conversa, segundo a manchete do blog, Temer teria dado o aval
para comprar o silêncio de Eduardo Cunha. No dia seguinte, às
dezesseis horas, o presidente fez um pronunciamento dizendo que não
renunciaria e alegou que não havia literalidade na gravação, sobre
ele ter dado aval para comprar o silêncio de Cunha. Sobre essa
literalidade, já publiquei um ensaio (aqui).
Por iniciativa do próprio
Temer, via imprensa e não via jurídica, diga-se de passagem, o
sigilo das gravações foi retirado pelo juiz do STF, no mesmo dia do
pronunciamento. No dia seguinte ao pronunciamento, o jornalismo
amanheceu adotando a alegação do presidente, dizendo que não havia
a tal literalidade. A estratégia de Temer prosseguiu acusando a
gravação de edição, a estratégia foi apoiada por perícias
patéticas divulgadas nos jornais Folha de São Paulo e O Estado de
São Paulo.
Peritos renomados refutaram as
perícias patéticas, entre eles o perito Ricardo Molina, que
surpreendentemente, foi contratado pela defesa do Temer, que, de
forma mais patética que os peritos que ele mesmo refutou, afirmou
diante da imprensa, que a gravação não é uma prova válida, mas
que ele ainda não tinha feito a perícia. Os meios de comunicação,
incluindo redes sociais, se tornaram o tribunal político e jurídico
do Brasil e se encarregaram de produzir a cortina de fumaça em
questão.
A atuação do presidente se
tornou secundária na novela, ficou mais próximo de um figurante do
que um coadjuvante, o protagonismo passou para a edição na
gravação, uma conspiração para eleger o Lula novamente presidente
da república e o acordo realizado entre MPF e JBS. Isso colocou a
Lava Jato no banco dos réus desse tribunal das opiniões. Antes de
mostrar o que vejo atrás da cortina de fumaça, vou analisar
brevemente, cada um dos fatores que compõem essa cortina de fumaça.
A gravação foi realmente
editada, posso afirmar isso com base no fato de que a gravação foi
feita com dois gravadores, portanto a gravação entregue ao MPF é
uma composição das duas gravações, mas isso não invalida a
gravação. Não vou entrar no mérito das perícias, isso é função
dos peritos e advogados envolvidos no inquérito, se houver algo
polêmico nas perícias, talvez eu publique uma análise.
Sobre a conspiração para
eleger o Lula, com a substituição do Temer através de eleição
direta, só posso dizer que é uma questão jurídica que não prevê
essa possível eleição, então não há motivos para aprofundar a
questão. Sobre o acordo com a JBS, trata-se de uma questão paralela
que não pode e não deve ser usada em favor do presidente, muito
menos para desviar a atenção do público em relação ao fato mais
importante, as atitudes do presidente.
É necessário lembrar que
existe uma possibilidade jurídica para a realização de eleições
diretas, baseada na lei eleitoral, mas é controversa e só poderia
ser aplicada no caso de cassação da chapa, que está em julgamento
no STE. Em caso de renúncia ou impeachment, não há possibilidade
jurídica de eleição direta, portanto não faz sentido criar uma
situação de renúncia ou impeachment, para eleger o Lula, pois isso
extinguiria justamente o processo no STE, que poderia permitir a
desejada eleição. A teoria de que o cordo do JBS tem o objetivo de
fazer uma eleição para eleger o Lula, é puro terrorismo barato.
Por trás da cortina de
fumaça, vejo o seguinte: o Temer recebendo o Joesley de forma tão
clandestina quanto a gravação que ele diz ser clandestina. Vejo a
JBS envolvida em falcatruas, e as revelando, onde está envolvido o
BNDS, mas vejo também que, essas falcatruas ocorreram quando o
Henrique Meireles, atual ministro da fazenda, foi por oito anos,
presidente do banco central, depois continuaram ocorrendo quando o
Meireles foi presidente do conselho administrativo da J&F, que
controla a JBS.
Então vejamos, se o Henrique
Meireles não sabia de nada, por que Dilma saberia o que acontecia na
Petrobras, ou saberia das tais pedaladas? Por que Lula saberia do
Mensalão e das propinas destinadas aos partidos? Se havia essa
montanha de falcatruas, envolvendo o BNDS, por que a atual presidente
do banco não as denunciou? Por que foi preciso que a própria J&F
(JBS) denunciasse? Não posso deixar de mencionar que Marco Antônio
Villa está cobrando um relatório da presidente do BNDS há um ano.
Agora é necessário mencionar
o que é possível ver sem nenhuma dificuldade, pois está na frente
da cortina de fumaça. A preocupação maior entre os políticos e
entre os “grandes empresários”, é manter a equipe econômica,
inclusive a presidente do BNDS. Henrique Meireles é um dos mais
cogitados para ser candidato à sucessão do Temer no colégio
eleitoral. É oportuno lembrar que o Lula articulou, publicamente,
para que o Meireles fosse nomeado ministro da fazenda pela Dilma, só
não foi por que Dilma e Meireles não se bicam, mas o impeachment
resolveu esse problema, não é?
A questão não é se Temer
fica ou sai, a questão é, se a equipe econômica fica ou sai. Temer
é descartável, assim como a Dilma, mas se for necessário mantê-lo
até o final do mandato, para manter a equipe econômica, ele será
mantido, não importa o custo. Essa é a questão que pode explicar o
acordo entre MPF e J&F, prender os colaboradores deixaria a
opinião pública satisfeita, mas não seria realizado o acordo,
permitindo que as falcatruas envolvendo BNDS e outras empresas
continuassem protegidas, inclusive continuando a serem praticadas.
Alguém acredita que JBS e Odebrecht foram as únicas beneficiadas
com falcatruas no BNDS? Aliás, o BNDS é sócio na JBS, como punir
um sócio sem punir o outro?
No
meu entendimento, o acordo com a J&F é secundário nesse
momento, inclusive porque existem instrumentos que permitem a revisão
do acordo em momentos apropriados e da forma apropriada. A questão
não está em eleger novamente o Lula, mas em tirar do poder a
organização criminosa inteira. São esses que estão no poder que
podem eleger novamente o Lula, e tenho motivos para suspeitar que
farão exatamente isso para continuar no poder. São esses que estão
no poder, que agiram de forma mais intensa, para enfraquecer a Lava
Jato. Para encerrar, não esqueçam que, em setembro deste ano, Temer
vai nomear o novo Procurador Geral da República.
(Milton Valdameri, maio de
2017).
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